A sensação de que a leveza da ponta dos pés não é suficiente
para afastar de nós as atenções que nos sufocam. A constante consciência de que
não somos suficientemente silenciosos, que as tábuas rangem ao nosso movimento,
que o pestanejar ensurdece, que as articulações chiam que nem maquinaria
abandonada. O esforço para suplantar os obstáculos, não arrastar os trapos
espalhados pelo chão e não tocar os objetos que fixamente emergem do solo irregular.
Mexer a colher inquieta na xícara sem roçar a loiça, permanecer inerte, no
escuro, camuflado, com olhos fechados, acreditando num qualquer poder de invisibilidade
daí decorrente. Uma lua esburacada a rir-se dos nossos esforços e um sol que
nos denuncia propositadamente e a conveniência desse silêncio que buscamos. A calma, a surdina, a translucidez que o meu corpo tomou, o esbarrar com o candeeiro partido no chão, os olhos atentos pregados em mim, a observância que distraio com um qualquer truque de magia falseado e à qual sucumbo novamente com movimentos torpes e a ponta dos pés, somente a ponta dos pés a tocar o chão...
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