Correm rumores de que a Joaninha nos vai deixar. Já está a
dar o tempo à casa, já a vi a fazer compras de última hora, sabonetes e
shampoos, com o namorado, que, pelos vistos parte com ela. Vai partir, porque
sente um vazio, a réplica da impotência que todos nós vamos sentindo.
O
António, que morava ali em Espinho, irmão do João que andou comigo na
Universidade, também já rumou, penso que para o Brasil. Cansou-se de esperar
pelo futuro e de incorrer, em adiamentos constantes, em recorrentes passagens
por um pretérito, já muito imperfeito ou por um presente já tão desgastado.
Cansam-se
assim, os muitos que se amontoam em filas das quais não se vislumbra sequer o
fim, serão talvez infinitas, pois ninguém de lá volta, ou se retorna, apresenta
aquele ar de cansaço, de quem correu atrás do pote de ouro, mas nada encontrou
ou então retornam conformados para tentar novamente no dia de amanhã. São, às
vezes, duas horas da tarde, e já deixaram de dar tiquets para o outro lado do
arco-íris.
Foi por
isso que partiu o António e se segue a Joaninha, porque já lhes doíam as pernas
e a coluna do prostramento constante a que eram submetidos, da espera
sucessiva, dos adiamentos repetidos e por não poderem esperar mais do que um
futuro próximo, um amanhã sempre inconclusivo, como se de uma pena perpétua se
tratasse.
De
malas a abarrotar de dúvidas e inseguranças, partem, em filas já também, para o
desconhecido, almejando um porvir que lhes permita sonhar e encontrar a
concretização para os seus planos. Fogem do marasmo, da falta de oportunidade e
das filas, daquelas que não têm fim à vista.
Eles já
lá foram, estão distantes em tempo e em espaço dos que cá ficaram, porque aqui
o tempo não passa, ou simplesmente se arrasta e permanecemos, então, no mesmo
presente desgastado e roído.
Resta
saber que destino nos compete, a nós que cá ficamos por pura teimosia, porque
nos falta a coragem ou porque, simplesmente continuamos a manter a utopia de
que um dia as filas possam encurtar, que deixem de nos passar à frente ou de empurrar,
que os tiquets cheguem para toda a gente e que a esperança, ganhe, enfim, um
novo simbolismo. Porque, no momento em que me encontro, numa espera perpétua
numa fila onde se acotovelam, onde se empurram e onde toda a gente transporta
os seus sofrimentos pessoais e os seus egos - uns ultrapassam as dimensões do
próprio ser, e roubam-nos um lugar na espera – apenas parece que Pandora não
resistiu à curiosidade e deixou mesmo escapar a última virtude.
Essa,
cabe a quem parte, que nada mais tem do que uns trocos para se governarem e as
dúvidas que não se dissipam. Às Joaninhas e aos Antónios, muito boa sorte…
Emigration song by AnalogPhotographers
http://browse.deviantart.com/?order=9&q=emigration&offset=48#/d1amk5j
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