domingo, 25 de setembro de 2011

Caminhos

Ruas estreitas, ruas largas, onde cabem dois corpos e uma bagagem, onde se cruzam olhares, onde ecoam palavras soltas, onde deambulamos olhando o secretismo de cada um que passa. Calçadas cheias de passos lentos, de gente que passa, com pressa e não para… Becos onde nos perdemos frente aos muros que não podemos escalar, vielas onde nos cruzamos sem mesmo planear. Margens destes rios, margens deste mar, onde os segredos são revelados, aqueles nunca antes contados… Pontes desenhadas sob os nossos pés... Caminhos cruzados, vários dias passados, noites que nos transformam e nos tomam… pelo amanhecer, somos já outros, redundantes nas metas, retomando caminhos, reconhecendo as caras, sem porém sair dos trilhos… Já não mais nos aventuramos nesses labirintos…


sábado, 24 de setembro de 2011

As viagens

Antes seja afastado do que já alcancei que o seja daquilo para que vou. A posse é um declínio.
Antes um pássaro a voar que dois na mão. Dois pássaros na mão são o que já não falta. Um pássaro a voar: é ir com os olhos a voar com ele; ir sobre os montes, sobre os rios, sobre os mares; dar a volta ao mundo e continuar; é ter um motivo de viver — é não ter chegado ainda. 

 Branquinho da Fonseca

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Os lugares de chegada

Palmilho a estrada de paralelos desgastados diariamente pelo frenético vaivém de gente sem rosto… todos os dias apressados, aos tropeções e aos empurrões... agarrados unicamente aos seus lugares de partida e às suas metas.

A mim parece-me que eu apenas sigo até onde a inteligência me leva e que todos os outros não seguem mais do que até onde necessitam.


Roubaram-nos a cor

Roubaram-nos a cor das palavras… parece que apenas digitamos corpos de letras que se unem sem sentido. Roubaram-nos a íris, o céu, as flores e as cores que emanam das nossas almas e andamos, por aí, descalços, torpes e com palavras cinzento-rato na ponta da língua. Trocamos caminhos sobre calçadas pretas e brancas até destino nenhum… Vagueamos num mundo pálido indagando apenas, onde teremos deixado as nossas cores... Fechamos os olhos em sonhos de sépia na ânsia de o amanhã nos trazer a paleta que outrora conhecíamos, sem concretização alguma porém… onde estão as cores que perdemos?

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Crise


Visto que isto já deve ter sido publicado onde de seu direito, partilho aqui também...

A Crise…
Possivelmente o vocábulo mais vezes repetido nos últimos tempos nas manchetes dos jornais, nos tópicos dos telejornais e até mesmo nas conversas que vamos ouvindo nas ruas. A crise é um motivo para quase tudo o que de negativo se tem vindo a suceder no mundo, no país que habitamos, nas nossas casas e até nos nossos próprios âmagos. Nada de estranhar, não fosse típico o fatalismo árabe dos portugueses:
- Olá, tudo bem? Como tens passado?
- Vai-se andando… Isto, com a crise, não está fácil…!
Desenganem-se se julgam que aquelas eram palavras de escárnio… pelo contrário, antes compassivas. É que, cada um de nós, de forma particular, tem vindo a sentir os males desta crise que se diz ter instalado por este mundo fora. Julgo porém, que a que nos tem tomado o ânimo, é aquela que já tem vindo a ser construída, há muito, por nossas próprias mãos e vontade… Não falo das crises políticas e ideológicas que abalaram o Médio Oriente. Não falo da crise económica do capitalismo e de apego aos bens materiais. Falo daquela que, pessoalmente, tenho sentido mais: a crise de valores. Tal como José Saramago afirmou, vivemos, hoje, e mais do que nunca, num estado de incompreensível “cegueira mental” consequência do “(…) egoísmo pessoal, o comodismo, a falta de generosidade, as pequenas covardias do quotidiano (…)”
Supostamente, o que nos separaria dos animais, seriam as nossas inteligências. Falo de inteligência mental e de inteligência emocional. Seremos porventura obrigados a admitir, que o nosso quociente emocional, no momento em que estamos, aproxima-nos mais do que nunca dos animais ditos irracionais, que atacam em prol da satisfação das suas necessidades próprias. Ora, seja este facto por consequência directa do ambiente, das ideologias políticas, do tumulto em que diariamente vivemos, ou talvez de uma junção de todos estes elementos, julgo que todos seremos obrigados a afirmar que o ser humano rompeu com uma série de valores nobres que nem sempre conseguimos reconhecer no ambiente selvagem, como os da amizade, da fidelidade, a honestidade, a solidariedade e deixamo-nos conduzir até uma vida de alienação para connosco e para com quem nos rodeia. Passamos a viver vinculados a um orgulhoso egoísmo pessoal, que a nada mais nos leva senão a lutar pelos nossos próprios interesses, comodismos, luxos e bem-estar, como um leão esfaimado em busca do seu alimento. Com uma simples diferença: a nossa busca não se resume a menos que uma luta sem aparentes vitórias ou troféus e das quais não trazemos satisfação, nem mesmo fisiológica, pois, ao animal, não assiste a moral que ignoramos com crueldade, visto que a sua busca, não é mais do que a tradução das suas necessidades essenciais. Empenhamo-nos tanto nessa batalha, que todos os dias damos por nós exaustos, porque apenas nos debatemos por nós, para nosso próprio benefício e nenhuma vitória é aplaudida, presenciada ou aclamada por quem quer que seja. E no final de tal feito, gastamos tempo tão caro a admirar os nossos umbigos e a enumerar as mais imperceptíveis falhas nos semblantes dos outros. Inevitavelmente, tornamo-nos gente dormente…
Mas agora que a viagem se tornou difícil para todos e cada um de nós, não se tornaria esta mais agradável se tivéssemos uma companhia? Uma agradável companhia?
E enquanto seguimos nessa viagem tão longa e tão morosa, seria nefasto darmos o nosso contributo pessoal para que ela se torne memorável?
Aqui, são aceites pagamentos e retribuições em géneros: sacos de humanidade, altruísmo quanto baste, compaixão a retalho, valores ao peso, filantropia por medida e tudo o mais que possamos transportar.
E o que fazemos nós com aquela bagagem que insistimos em carregar por todo o lado e que tanto nos pesa?
Fácil… livremo-nos dela, todas as réstias de egoísmo e de desprezo pelos iguais, num momento tão difícil, apenas farão, deste percurso, uma viagem solitária pelos itinerários mais agrestes.
Tendo posto isto, acredito, ainda que estas não sejam palavras sábias ou desgastadas pelo tempo, que, a partir do momento em que nos comprometermos a fazer a viagem juntos, seremos novamente gente consciente e quando começarmos a descer nos nossos próprios apeadeiros, muita da crise que sentimos até então, já terá partido porque “Onde todos ajudam, nada custa”
2 de Setembro de 2011.
A. Rocha
(sou eu) :)


"Train is.." (em P&B)
By Zimaz
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